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Não Há Silêncio na Escritura

nao-ha-silencio-na-EscrituraTenho me arriscado a escrever sobre alguns assuntos que até pouco tempo sequer tinha a menor ideia. Isso se deve especialmente à renovação da minha mente pelo Espírito Santo, e a leitura das Escrituras. Mas não há como rejeitar aquilo que os santos de todos os tempos escreveram e ainda escrevem, seja em livros, artigos, pregações ou postagens em sites e blogs.

Pretender ser uma mente “neutra”, partindo-se do zero é pura prepotência e soberba, além de ser uma conclusão estúpida e enganosa em si mesma. Não tenho problemas em assumir o que sou, e o que tenho sido é fruto da ação de Deus através da instrumentalização do corpo de Cristo, capacitado pelo próprio Deus a auxiliar os membros no conhecimento e entendimento da verdade. Isto não quer dizer perfeição nem infalibilidade, mas um processo lento em que, mesmo na imperfeição e vivendo com a natureza pecaminosa, o Senhor vai-me afastando cada vez mais de mim, e me colocando cada vez mais próximo de Cristo. E, de forma alguma, ninguém pode dizer que o conhecimento adquirido ou a ignorância cultivada é fruto exclusivamente de si mesmo. Mas esta é apenas uma introdução, não o assunto deste texto.

Dito isso, abordarei mais um tema do qual não domino, mas tenho o entendimento suficiente para considerá-lo verdadeiro: o pressuposicionalismo bíblico.

Interessante que alheio à metodologia humanista de se avaliar e colocar o texto bíblico à prova da razão e da ciência, as pressuposições interpretativas serão a base para a exegese; ou seja, nenhum estudioso interpretará as Escrituras sem pressuposições, e a afirmação de que existe uma “neutralidade” no estudo não passará de uma grande farsa.

A questão é: ou se interpreta a Bíblia através das pressuposições sobrenaturais, ou a fazemos através das pressuposições racionalistas e liberais. Delas dependerá o caminho a ser tomado. O que significará utilizar de pressuposição interpretativa crente e ortodoxa ou incrédula e liberal.

Na verdade o incrédulo baseará o seu estudo a partir da incredulidade; enquanto o crente baseará o seu estudo a partir da crença bíblica.

Defender uma isenção ou neutralidade é sempre uma forma de engano, de se auto-enganar, tendo-se em vista a impossibilidade de interpretação a partir do nada, da neutralidade, pois, sem se partir de algum ponto específico é impossível se chegar a algum lugar.

Porém, isso não quer dizer que as nossas crenças se sobreporão à Bíblia, que se chegará diante dela com tudo ajeitado, esperando apenas a confirmação, a qual implicará, muitas vezes, em conspurcação, em distorção do texto bíblico. Ao contrário a Escritura deve avaliar e validar se todas as nossas crenças estão, de fato, concordantes com a revelação proposicional de Deus. O incrédulo e liberal utilizará a sua fé não-sobrenatural e irracional, ancorado em falsas premissas, a deduzir que tudo deve partir e ser explicado pelo homem. Deus é simplesmente descartado do método, revelando o quanto o discurso racionalista não passa de um embuste irracional, tendencioso e desonesto de se interpretar a realidade escriturística.

Então podemos dizer que a interpretação bíblica estará respaldada pela fé, que estará sustentada por suposições ortodoxas. Temos, por assim dizer, um círculo vicioso, certo? Errado. Simplesmente porque assim como Deus pode ressuscitar um cadáver e soprar vida numa alma morta [o que os liberais terão uma infinidade de desculpas e justificativas no mínimo absurdas e estapafúrdias para não reconhecer a sobrenaturalidade bíblica e reafirmar a sua incredulidade], assim também Ele pode transformar nossas pressuposições. E isso acontece infalivelmente na regeneração, no novo-nascimento, quando o Espírito Santo reorientará as pressuposições do homem em relação à Bíblia. Já que o homem caído, o homem natural, encontra-se no estado de rebeldia contra Deus e a Sua palavra, sendo-lhe impossível concebê-la como a fidedigna revelação divina. Somente após o novo-nascimento ele estará em disposição intelectual para aceitá-la e sujeitar-se a ela pela renovação da mente, tornando-a semelhante à mente de Cristo.

Ainda que o seu entendimento inicial seja limitado, e algumas das suas antigas pressuposições ainda permaneçam nos detalhes, à medida que a palavra for-lhe revelada, ele estará crescendo na graça, deixando de tomar leite para comer carne, amadurecendo-se, santificando-se, progredindo no entendimento da Bíblia e da Fé que foi uma vez dada aos santos.

Logo a tarefa interpretativa deve estar pautada por pressuposições teológicas [pressuposicionalismo], fundamentadas na ortodoxia cristã, ao invés de se recriar novas ortodoxias [ou seriam heterodoxias?] a cada geração que, na verdade, têm como único objetivo demolir a fé bíblica e disseminar o ceticismo iluminista. Faz-se necessário apelar constantemente à Bíblia, “a Palavra santa e viva de Deus, que nos reorienta e que refina as nossas pressuposições e proporciona um entendimento cada vez maior da revelação escrita de Deus, dentro dos limites da ortodoxia cristã” [1].

Mesmo sendo possível aos exegetas discordarem ou se contraporem à infalibilidade bíblica [de chegarem à conclusão da não infalibilidade do texto sagrado], o problema estará na abordagem “científica” que os levará a compreender o método humano como infalível, mesmo que substituído por outro, e por outro, e mais outro, e tantos quanto forem necessários para que a ciência sempre seja o argumento final de todo o processo interpretativo [excluindo-se qualquer hipótese de sobrenaturalidade bíblica], levando-a ao extremo de ser o dogma principal da crença naturalista: a fé cega na ciência; o que implicará sempre no silêncio de Deus para eles, quando o Senhor está a falar ativa e diretamente em toda a Escritura.

O próprio fato de tê-las diante de nós é a prova cabal da sua infalibilidade, “e qualquer outra conclusão de uma, assim chamada, exegese ‘objetiva’ é categoricamente equivocada – e enganosa” [2].

A imperfeição humana e o seu estado caído são provas da impossibilidade de se obter a “precisão científica” tão decantada e idolatrada pelos estudiosos, mas que no fundo, não passa de uma tentativa insignificante e frustrada de se “avaliar” a revelação especial, além de ser uma afronta a Deus.

O único padrão válido para a interpretação bíblica e seus aspectos históricos, éticos, artísticos, etc é o da Bíblia, a qual é a voz do próprio Deus. Portanto, infalível. Assim o método interpretativo levará, se bíblico, ao conhecimento da verdade; se extrabíblico ou não-bíblico, ao aprofundamento cada vez maior no engano. O que me leva a concluir a completa e total impossibilidade do homem natural conhecer a Deus a parte da revelação escriturística, sem que o Espírito Santo opere em sua mente regenerando-a.

Em linhas gerais, todo o esforço interpretativo do homem não-bíblico somente o afastará mais da verdade; enrijecendo-lhe a mente ao ponto em que todo o seu esforço “científico” o levará mais ao abandono e ao não-conhecimento de Deus. Ele terá uma idéia do que venha a ser o Todo-Poderoso, porém será uma imagem tão distorcida que nem mesmo o mais eficiente espelho esférico poderá reproduzir.

Na verdade, enquanto muitos acreditam enganosamente no silêncio de Deus, Ele estará sempre a falar.

Porque não há silêncio na Escritura.

Notas:

[1] “Infalibilidade e Interpretação”, de Rousas John Rushdoony & P. Andrew Sandlin – Editora Monergismo – pg. 61
[2] idem – pg. 75

Fonte: Kálamos

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